Por uma ciência mais inclusiva
Este privilegiado espaço vai hoje para a campanha #CientistaTrabalhando, que celebra o Dia Nacional da Ciência. Ao longo do mês de julho, colunistas cedem seus espaços para abordar temas relacionados ao processo científico.
Quem escreve é Vanessa Romanelli Tavares, 34, pesquisadora e doutora em genética pela USP. Pessoa com deficiência, como eu, também está na labuta por mais inclusão, acesso e espaços de cidadania para a diversidade humana.
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Nesse primeiro semestre, a ciência, confrontada com a pandemia do novo coronavírus, se viu alçada ao papel de protagonista dessa minissérie sem data para acabar.
A mesma ciência escanteada pelos crescentes cortes de verba nos últimos anos é agora cobrada por soluções a curto prazo.
Bem, a despeito da magnitude do ônus para a saúde pública e a economia, pelo menos esse momento crítico abriu espaço para se discutir o processo científico.
Quando criança, me lembro de ouvir que em dez anos, mais ou menos, haveria uma medicação para a atrofia muscular espinhal (AME), condição rara, genética e grave que afeta os neurônios motores e se manifesta em diferentes graus de comprometimento.
Nasci com ela. Naquela época, eu me perguntava por que a ciência era tão lenta…
A ciência se baseia em evidências para garantir a segurança e a eficácia de uma terapia. Na ciência básica, investigamos as causas de uma doença e, quando sabemos qual flanco “atacar”, conseguimos propor um tratamento.
Só então começa a fase pré-clínica da pesquisa, quando recorremos a animais e modelos de células para entender melhor a abordagem proposta.
Se essa fase é concluída com sucesso, começam os estudos em seres humanos —mais três fases e uma derradeira, o pós-marketing.
Embora o caminho pareça linear, muitas perguntas surgem ao longo do processo.
No que diz respeito à AME, quanto mais cedo ela for diagnosticada, melhor será o prognóstico de tratamento.
Como propiciar a crianças com essa condição acesso a um diagnóstico precoce e tratamento antes do aparecimento de sintomas?
Foi essa pergunta que norteou meu trabalho de pós-doutorado, sob coordenação da doutora Mayana Zatz, no Centro de Pesquisas sobre o Genoma Humano da USP.
De pergunta em pergunta a ciência vai sendo construída, buscando soluções para a melhoria da saúde da população.
Atuando hoje em dia com pesquisa em genética, só posso louvar a representatividade em colunas como essa, que dá voz a cientistas e, no meu caso, a uma cientista com deficiência.
No Brasil, somos 24% de pessoas com deficiência, das quais somente 6,7% chegam ao ensino superior (segundo o censo de 2010).
Não existem dados sobre o acesso à pós-graduação, caminho obrigatório de qualquer carreira científica.
Para se desenvolver e acompanhar a ciência mundial, cientistas costumam frequentar congressos e especializações no exterior.
Porém, quando se fala em fomento à ciência, esquece-se da necessidade de proporcionar aos cientistas com alguma deficiência a possibilidade de tais atividades —oferecer, por exemplo, verba adicional para viabilizar um acompanhante ou permitir que a pessoa se hospede em um hotel adaptado, se necessário.
Ainda há inúmeros desafios para a ciência brasileira, mas você pode ter certeza que sempre haverá um #CientistaTrabalhando por você e para você.