‘Malacabados’ também querem rock, bebê!
Aos poucos, o povo sem perna, sem braço, com o escutador de novela avariado entre outras “peculiaridades” está tomando os espaços sociais que são legitimamente seus também, como são de qualquer cidadão.
Até pouquíssimo tempo atrás, ver um cadeirante ou um cego numa balada, num espetáculo era razão para chamar o Samu porque algo estranho estaria acontecendo, hoje, a situação está ficando, ainda bem, mais corriqueira.
O que ainda não entrou “nos conformes”, como diz o pessoal lá da minha terra, é o outro lado do bancão, as instalações de diversão que ainda ignoram que nem todo o mundo é certinho das partes e que é necessário acesso pleno e condições de entretenimento digno para a diversidade física e sensorial.
Nos cinemas, um movimento forte de surdos que usam a língua portuguesa está fazendo barulho. Isso porque, em várias salas de exibição está se abrindo mão da legenda (apresentando apenas versões dubladas ou na língua original do filme), o que inviabiliza o entendimento da trama por esse público.
Os empresários da diversão, muitas vezes, parecem ignorar a lei ao fazerem espaços acessíveis sem nenhuma preocupação com qualidade, apenas para constar. Meu amigo Rodolfo Sarudiansky, fã de rock and roll e frequentador de vários show, escreveu um desabafo pro blog, que concordo com todas as linhas.
Abrigar bem a diversidade não é ser bonzinho. É ser cidadão que cumpre a lei e que está de olho em lucros (temos lá nossos trocados), com um novo público consumidor.
O texto do Rodolfo tá uma “deli”, engraçado, informativo e didático! O blog vai hibernar por uns dias! Tirarei férias… Beijos nas crianças
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É lei, todo mundo sabe. Seja num cinema, restaurante, teatro sempre tem que ter uma rampinha. Se for em evento grande tipo grandes shows de rock então é certo que vai ter um cercadinho para colocar os “manquetas” e tortinhos em geral se sentindo seguros, geralmente a 700km de um palco.
Acessibilidade não é rampinha! É o pleno uso de um determinado espaço, tornando as limitações físicas imperceptíveis.
Não quero ver o bombeiro, quero ver meu ídolo, estou sentado mas sou fã. Tive várias experiências em shows de rock e garanto, pra assistir de longe, fico em casa.
Já encarei Guns n Roses, Aerosmith e Halestorm no Rock in Rio no meio da galera, na fila do gargarejo durante horas, horas e mais horas e te garanto, quase nada se compara a esta força que é a grade de um show de rock.
Perigoso? Claro! Podia ter morrido? Óbvio! Mas infelizmente pra alguns, não morri. O tema é tratado como obrigação e é isso que tem que mudar.
Se observarmos o local reservado a deficientes nas salas de cinema geralmente é um dos piores do local, ficando quase grudados na tela. Lembro que quando estavam construindo o cinema daqui de Rio Claro (interior de SP), conversei com o boçal do arquiteto que me mandou procurar um massagista pra cuidar do pescoço já que o local era mal posicionado, ou seja, o cara ta pouco se importando.
Nos grandes festivais somos invariavelmente deixados de lado. Fui a três edições do Rock in Rio, não porque eu adore o festival mas sim porque Deus, quer dizer, Axl Rose, iria se apresentar em 2001 e 2011 e a musa Lzzy Hale em 2015. Em todas as edições a área para pessoas com deficiência era ruim mas, na última, parecia piada, era atrás do bar! Nem os caras do festival sabiam onde era de tão ruim!
Aproxima-se o MAXIMUS FESTIVAL e segundo os organizadores, depois de uma conversa inflamada, me informaram que o local será bom, mas não me definiram o padrão de bom deles.
O que queremos? Respeito! Queremos ir ao evento e ver nossos ídolos, queremos que os idealizadores de eventos sentem suas bundinhas numa cadeira de rodas e vejam o ídolo deles da área de pessoas com deficiência e sintam o que sentimos. Queremos áreas próximas dos palcos que garantam o aproveitamento do espetáculo.
MEU NOME É RODOLFO SARUDIANSKY, 41, CADEIRANTE, TENHO AMIOTROFIA MUSCULAR ESPINHAL TIPO II, E, ACIMA DE TUDO, SOU DO ROCK!
Jairo , até quando vc fica de ferias
Já voltei!
Delícia o texto do Rodolfo. A foto no meio da quizumba, então, não tem preço. Há controvérsias quanto ao Deus Axl, mas o rock é um Olimpo, tem pra todos. Ele sintetiza de forma bem-humorada e eficaz a encrenca que é enfrentar um evento para multidões – o que não significa que um ‘petit-comité’ seja mole – até porque mesmo um restaurante pode ser um problemão. O cinema é um caso à parte, já que está longe de se restringir a Rio Claro, bastando dizer que sou frequentador de cinemas da rede Cinemark e duvideodó que algum quebrado consiga se safar do torcicolo ao final do filme. Só o que historicamente se pede é respeito que, nas palavras do próprio Rodolfo, pode ser conseguido após o momento em que “os idealizadores de eventos sentem suas bundinhas numa cadeira de rodas e vejam o ídolo deles da área de pessoas com deficiência e sintam o que sentimos.” Tomara que o otimismo dele prevaleça.
Eu, outro Rodolfo, também deficiente e fã de rock, sou presença garantida na maior parte dos chows de rock. acabo não tendo tanto prejuízo pela visibilidade ruim dos locais reservados, por que, afinal, ficar cara a cara com o palco também não me faria enxergar o artista! mas óbvio que a demanda vai muito além disso, e dou os parabéns por trazer para esse espaço uma pauta tão importante.
Felizmente existem pessoas deste calibre para expressar o óbvio, que em nossa sociedade brasileira é tão ignorado.
Em países desenvolvidos os que possuem limitações, físicas sobretudo, os idosos etc. são respeitados como cidadãos e podem viver mais tranquilos, acessando lugares públicos, meios de transporte etc. sem sentir insegurança e medo, como ocorre aqui no Brasil.
Parabéns ao articulista.
Saudações