Ao conduzir tocha artificialmente em pé, Lais Souza ignora quem vive sentado
Não entendi a razão de a ex-ginasta Lais Souza ter usado para conduzir a tocha olímpica em um dos momentos de sua passagem por São Paulo uma geringonça que faz o povo estropiado das pernas ficar em pé e até dar umas voltinhas.
Ao contrário de me comover, a papagaiada midiática protagonizada pela moça, que rendeu fotografias bonitas, provocou em mim um desconforto e levou o debate da inclusão para um nível de retrocesso que eu pensava já ter sido superado. Ainda não se compreendeu que as pessoas podem viver muito bem em sua condição de cadeirante, de cego, de surdo, de autista, de anão.
Lais, diante da realidade das pessoas com deficiência no Brasil, tem privilégios de magnatas: direito a uma pensão integral paga pelo contribuinte —o que considero justo—, um cuidador atencioso que topa carregar até fogo por ela, acesso a tratamentos supostamente revolucionários nos Estados Unidos e apoio popular irrestrito à evolução de sua condição de tetraplegia.
Quando Lais desfila em pé, atada por fivelas, olhando para os mortais “malacabados” por cima, mesmo que inconscientemente, ela passa mensagens que não casam com as batalhas da diversidade: “Aqui de cima é bem mais legal”, “Se esforce, que você volta a andar”, “Tudo vale a pena para ser igual aos outros”.
Equipamentos de acessibilidade, como a cadeira de rodas que possibilita ficar em pé com treino e supervisão de especialistas, servem para melhorar enroscos cotidianos de uma deficiência. São úteis para reduzir entraves provocados por perdas, não para substituir uma realidade torta por uma novinha, normal.
Ficar em pé naquele instrumento pode ajudar na circulação do sangue pelo corpo, pode melhorar o equilíbrio, serve para apanhar objetos mais altos e até para fazer pequenos deslocamentos. Tudo isso melhora a qualidade de vida. A meu ver, a cadeira não serve para saracotear diante do público, carregando um símbolo universal, transmitindo nas entrelinhas uma mensagem vã de esperança que mais atrapalha do que agrega.
Andar amarrado em uma máquina não é prioridade para milhares de lesados medulares que perdem movimentos de braços, de pernas e até do pescoço. Avanço bom é aquele, ainda fomentado pela ciência, que vai melhorar a sensibilidade, que poderá retomar funções fisiológicas afetadas, que vai possibilitar que se trabalhe melhor, que se viva em sociedade com mais autonomia e que o relacionamento com o outro tenha menos obstáculos.
A criação de uma identidade respeitada passa pela valorização da condição que se tem —seja ela qual for—, solidifica-se com representações adequadas e afirma-se com protagonismo sem disfarces ou subterfúgios.
De lembrança da tocha, vou guardar a imagem do atleta cadeirante da canoagem Fernando Fernandes, que recebeu de Lais o símbolo e deu a ele a legitimidade da persistência e da ardência da coragem de seguir em frente fazendo, de quebra, um discurso enaltecedor do valor do esporte paraolímpico.
Em tempo: vou descansar a beleza por algumas semanas. Saio em férias! Volto em setembro se Zeus quiser.
Meu Deus como o ser humano é pote de espírito em não aceitar as diferenças.
O assunto é de tal maneira complexo e polêmico que me leva a não concordar totalmente com você. Laís mostrou-se uma moça corajosa ao não dar sinais de desistência após seu acidente. Também foi formidável assumindo sua orientação sexual – ou abordando abertamente suas nuances. Entendo que ela merece meu respeito, principalmente porque não tenho como aferir o quão grandioso ou terrível é o problema que ela enfrenta.
Entendi e respeitei seu posicionamento inicial uma vez recebidos o diagnóstico e o prognóstico, ambos nada animadores. Com o tempo, porém, e com base em diversos pronunciamentos que fez e atitudes que tomou, acabei por concluir que não poderíamos contar com ela na luta pelo respeito, pela acessibilidade e tudo aquilo, enfim, que envolve este mundo de pessoas (ainda) invisíveis na maioria das situações e que, por serem acintosamente invisíveis, precisam repetidamente pedir por uma rampa, por uma vaga na escola, por um cardápio em braile e mais uma tonelada de atitudes de governos e compatriotas no sentido de romper as barreiras atitudinais e arquitetônicas diárias.
Discordo também quanto à pensão da previdência. Ao que me consta, ela nunca contribuiu. Não teria direito, portanto. O valor é pequeno mas seu tamanho é irrelevante frente à desfaçatez e o jogo de cena governamental que geraram o benefício. Fere a dignidade de tantos, deficientes ou não, que contribuíram e tiveram a integralidade negada por burocracia ou norma.
Ela é muito jovem, e não creio que ao participar do desfile da tocha tivesse em mente algo além disso. Não vi em sua atitude nem mensagem de esperança nem postura de superioridade frente aos seus ‘iguais’. Ela simplesmente estava ali, sem bandeiras, mas é claro que, mesmo de forma inconsciente, pode ter transmitido alguma mensagem subliminar.
Enfim, a exemplo daquele cantor das muitas emoções, Laís Souza não me suscita expectativas. Aliás, não as suscitou sequer como atleta. Espero que encontre a felicidade tão insistentemente buscada, em que pese estar certo de que sua obstinação por uma ‘cura’ de novela das nove está longe de ser o caminho para isso.
Seu artigo, mais que corajoso, levantou multidões conforme avaliei logo após lê-lo. Resolvi aguardar um pouco para me pronunciar, e devo dizer que não fiquei surpreso com o caráter belicoso de boa parte dos que se manifestaram.
Teve seu lado instrutivo: eu até o conheço um bocadinho, mas alguns comentários me permitiram saber que você não tem ideia do que é viver sobre uma cadeira de rodas, é dado a invejinha, bitolado que só escreve sobre o ‘mundo deficiente’. A cereja foi um pateta chamá-lo de ‘doido petista’. Admito que me diverti um pouquinho.
Ficou claro que um percentual majoritário não o conhece nem à sua trajetória como jornalista, colunista e blogueiro. O chato é que se utilizaram desse desconhecimento para atacá-lo, porque você de repente levantou uma questão-tabu sobre a qual é possível que nem haja tanta opinião formada assim, mas que esbarrou no tal coitadismo que situações do tipo vira e mexe provocam.
O que se espera, porém, de uma matéria inteligente e provocativa, é exatamente a discussão (civilizada) por meios da colocação dos diversos pontos de vista, jamais um linchamento como ocorreu. A dicotomia é um veneno contra diálogos saudáveis, e se mostra uma praga que de há muito já ultrapassou o ambiente partidário.
Abraço, meu amigo! Obrigado pela contribuição ao debate
Faltou dizer, Jairo: respeito mas lamento que Laís insista em negar sua deficiência, pois uma atitude positiva nesse sentido por uma pessoa pública poderia render e agregar bons frutos na nossa luta pela inclusão. Talvez o tempo e as circunstâncias da vida acabem por mostrar a ela que os obstáculos oferecidos pelas ruas, praças, edificações e aeroportos também a afetarão, serão diários e não oferecem medalhas. Aí então, quem sabe, ela se conscientize e utilize sua visibilidade para se juntar à turma.
Concordo plenamente com o articulista. Se outras pessoas desfilaram com a tocha usando uma cadeira de rodas ela também poderia fazer isso e não utilizar aquela engenhoca ridícula apenas para fazer de conta que está de pé, Não gostei pois há milhares de pessoas deficientes físicas que tem dificuldade de sequer comprar uma cadeira de rodas comum de empurrar. Zero pra ela.
A alegria dela por estar de pé, novamente, é visível.Tambem já pensei em arranjar um igualzinho para dar uma voltinhas e aumentar meu ângulo de visão.
Vale a pena reavaliar suas convicções sobre o assunto.
O cara ao lado dela é que pode dizer que carregou a tocha.
Achei o TEXTO totalmente desnecessário, impróprio entre outros. Não merecia se quer ser comentado. Meu caro autor DESSE TEXTO ridículo, por favor, aproveite suas férias, aprenda á ficar de BOCA FECHADA, E NÃO VOLTE!!!! NOS POUPARÁ DE OUVIRMOS TANTAS BESTEIRAS DE UMA SÓ VEZ!! UMA DAS POUCAS ATLETAS Q PODEMOS DIZER MERECEDORAS DE CARREGAR ESSA TOCHA!!! FICA QUIETO Q O SR ESTARÁ FAZENDO UM FAVOR AOS LEITORES!!! SIMPLES ASSIM!! SEM NOÇÃO!!! AFF
Matéria ridícula, sempre tem invejosos, agorando a possibilidade dos outros terem melhores condições e recursos…deveria olhar pelo lado de estar mostrando uma tecnologia que vem pra ajudar.
Jairo,
gosto muito dos seus textos, mas este em especial me causou sensação estranha ao ler, sem nenhuma revolta como a de muitos que comentaram aqui, não chego a tanto, mas posso afirmar que este seu “conjunto confuso de palavras” nada acrescenta ao debate da inclusão, e lhe causa tanto retrocesso quanto as alegações que você aponta na atitude de Lais.
O que mais me surpreende, é que sendo você cadeirante, não demonstrou um mínimo de complacência ou compaixão pela moça. Lais Souza era atleta olímpica, acostumada a superar limites com seu corpo, e hoje, jovem ainda, nem das paraolimpíadas pode participar, imagino o quanto é difícil para ela superar tamanha perda… talvez por isso, a decisão dela em usar a tal ‘engenhoca’ ao invés da cadeira de rodas, e poder ter o gosto derradeiro de sentir-se atleta mais uma vez, e nada disso teria a ver com a ‘papagaiada’ imaginada por você.
Enfim meu caro, certas críticas às vezes são desnecessárias, e esta do seu texto semanal na Folha de São Paulo foi desnecessária, mas isso é o de menos, penso no estrago que causou com suas palavras, ao coração desta jovem… e sei que você como bom escritor que é, poderá vir com novo texto em forma de réplica, quem sabe causando mais estragos… da minha parte surpreenderia se escreve um antidoto para o seu veneno, desculpas talvez, tiraria-lhe o chapéu por isso… no mais, ainda o admiro e continuarei lendo o que escreve.
Abraço e boas férias com Zeus, parece que está precisando mesmo..
Elson
Quanta bobagem esta matéria! Não encontrou nada melhor pra “meter o pau”? De onde tirou que ela passa as mensagens: “Aqui de cima é bem mais legal”, “Se esforce, que você volta a andar” e “Tudo vale a pena para ser igual aos outros”? Parece uma certa dor de cotovelo, invejinha. Deixa ela ser feliz e cuida da sua vida! Se ela ou qualquer outro quer ou precisa andar nesta jeringonça e está bem qual o problema? Podia ser uma cadeira voadora ou um tipo de carrinho de rolimã… quem se importa?! O que vale é a pessoa estar feliz!
Complementando: os vencedores são os que lutam e sorri para a vida, os perdedores só reclamam dela.