Carta ao candidato

Folha

Resolvi escrever porque já se está a um beiço de uma pulga das eleições e, por mais que eu assista aos debates, acompanhe o show de horrores do horário eleitoral na TV, leia as notícias, sinto que não o conheço a ponto de confiar meu voto ou mesmo o meu cachorro na coleira.

Não consigo entender, seu candidato e sua candidata, como é possível você cacarejar ser contra os direitos civis sendo que, por todo lado que se olhe, nota-se claramente que o mundo é “das gay”, “das sapatão”, das vadias e das novas famílias.

Não consigo entender como você consegue tirar tantas “selfies” pela rua, tocar tambor animadamente, segurar criancinha borrada no colo, de uma forma tão fofinha, se em seus discursos não se escuta nada sobre infância, sobre direitos humanos, sobre construção de amor entre as pessoas, sobre projetos para incentivar a paz, o bem e os coraçõezinhos.

O senhor gritou sentido e pensou nos pequenos quando ouviu a gravação do Bernardo clamando socorro? O senhor vestiu uma camiseta com a inscrição “não é só pelos 20 centavos” e vai dar dignidade aos transportes públicos?

O senhor cumpriu o desafio do balde de gelo e sabe que doenças raras são relegadas à própria sorte no país? O senhor tem um gato vira-lata adotado e saca que bicho, hoje, é família? O senhor sabe por onde está o garoto amarrado ao poste e tem ojeriza, como eu, quando se avalia que solução para a criminalidade é prender meninos?

Prego os olhos em suas palavras e da sua boca só saem números obtusos, defesas a respeito de acusações de bandidagem sua ou de sua gangue, promessas de um país tão bom como é Minas Gerais –que é tão longe e diferente daqui do Amapá–, uma falação sobre rompimento com a “velha maneira”, numa demonstração de que a história, para você, tanto faz como tanto fez.

Queria vibrar ao ouvir você falando sobre os velhos, seu candidato. Mas não aquela papagaiada de sempre assistencialista e caridosa. Os velhos estão no “Face”, seu candidato, querem trabalhar, querem proteção básica, respeito, lazer, mas sem esse nhe-nhe-nhem besta de que você vai “cuidar deles com carinho”.

O senhor é muito ocupado, seu candidato, e não deve saber, mas existem milhões de eleitores no país que não podem andar, ver, ouvir ou tudo isso junto. Há, por aqui, seu candidato, “serumanos” tchubes das ideias, mas que são cidadãos.

Não ouço o senhor falar em inclusão fora das fronteiras médicas e hospitalares. Esse povo não é doente, seu candidato. Esse povo quer acesso, quer estar junto, quer poder chegar a Brasília e estender uma faixa de protesto, como um grupo social qualquer: “Vou pela rua porque aqui no Brasil as calçadas não prestam, presidente”.

Para ter o meu voto, você vai precisar ser menos “coxinha” –me mandando buscar respostas em seu plano de governo– e mais atento às demandas do mundo de hoje. Precisa ter uma inteligência que me cative as emoções e me satisfaça a razão.

Queria ter vontade de recebê-lo em minha casa para discutir diplomacia e o prazer de acompanhá-lo na cracolândia –sem seus cupinchas para falar com os “noias” sobre futuro.

Aguardo sua resposta, por e-mail, comentário no blog ou scrap nas redes sociais. Abraço.

Comentários

  1. Ô Princeso! Bão!?
    Que bom que você tocou no assunto.
    Eu como sou um “cabôco” desinformado aqui do interior do longínquo Mato Grosso do Sul sempre ouço falar que devo ouvir as propostas e os planos de cada candidato para formar minha opinião e votar conscientemente.
    Eu tentei, juro que tentei. Mas tô com um “pobrema” e talvez ocê que se tornou um empurrador de cadeira cosmopolita e letrado possa me ajudar.
    A pergunta é simples:
    C sabe como eu faço pra tirar essa vontade de “gumitá” quando eu vejo e ouço os danados no horário político?
    “Bêjo”!

    1. Uai, fio, mas é craro que eu sei…. toma eprocrer antes e depois que o gorfo num vem…. kkkkk É, meu amigo… eles continuam achando que somos idiotas e alienados… abraço

  2. Má-fé cínica ou obtusidade córnea? É o que perguntaria Eça de Queiroz. Acredito em obtusidade córnea. Sempre existe saldo positivo no debate político, na participação do povo nos destinos do país. Os defensores do status quo sabem disso e tudo fazem para que as eleições ocorram sem campanhas eleitorais. Preferem os pleitos às campanhas; preferem atos eleitorais simbólicos, espaçados, indiretos e eleitorado despolitizado ao exercício pleno da democracia. Desprezar o valor das campanhas eleitorais, portanto, é uma posição politicamente ingênua.

  3. Amigo Jairo, esse seu desabafo é emocionante e totalmente atual, parabés.
    Coloco um desafio aqui, será que algum político com ou sem mandato fará algum comentário? Eu acho que não, vamos esperar!
    Nos conhecemos em Fernando de Noronha na inauguração da Praia sem Barreira, e lá vi sua capacidade como ser humano e como jornalista na luta em prol do seguimento da pessoa com Deficiência.

    1. Ôh, Alexandre, que bacana te ler aqui. Olha, não tenho nenhuma esperança de provocar debates com os candidatos, como eu disse, eles estão sempre preocupados com questões que pouco nos interessam… Grande abraço

  4. Oi Jairo, muito bom seu texto. Também fico horrorizada de ver que em lugar de se preocupar em dar escola de boa qualidade para todas as crianças em tempo integral, os candidatos querem gastar para re-educar as crianças que não foram à escola formal, se formaram na escola da vida e se transformaram em pequenos marginais. É isso aí, Jairo, o mundo está de cabeça para baixo. E nós aqui, sem um candidato que preste. Ou se tem eu desconheço. Abraços, meu querido, muita saudade sua. Andei sumida, mas … tô voltando. Beijos… beijos… para você e sua querida…

  5. Pois é nossa democracia esta doente precisando de remédios,mas os médicos de plantão ignoram!Parabéns pelo comentário!

  6. “Menino Bão” vou citar cada paragrafo com os meus alunos, escrito com tanta verdade que chega e me fazer chorar. Sexta- feira vou levar como texto a ser debatido em sala de aula com meu alunos idosos. Obrigada por esse texto tão verdadeiro infelizmente! bjosss e upas

  7. A midia hoje diz q Marina defende projeto q tira royalties de petroleo do RJ. Toda a população do Estado do RJ (e do Brasil) sabe q sem receita de royalties, o Estado do RJ quebra, comprometendo a precaria estrutura d serviços d saude, educação e segurança publica e assim tb, o turismo fonte crucial de $ carioca. como o RJ é colegio eleitoral d 8,5% dos brasileiros, me parece q para Marina vencer 2º turno, precisará possuir diferença superior a 8,5% pois abriu mão do eleitor carioca. FUI

  8. Amigo Jairo…perfeito.
    Espero, do fundo do meu coração, que os candidatos (todos), leiam essa publicação e façam um minuto de reflexão a respeito dos assuntos aqui tratados.
    Parabéns!

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