Deficiências temporárias

Jairo Marques

Todo ser vivente desse mundo tá exposto a quebrar as partes. Bobeou, lá vai uma canela, um cotovelo, um ouvido arruinado, um olho inchado, a cabeça enfaixada.

Assim, lá se vão meses de engessamento, botinhas horrorosas, fisioterapias, água quente na lomba e andares devagarzinho para fazer qualquer coisa.

Nessas horas, infelizmente, é que muito brasileiro passa a entender um pouco os perrengues que sente todos os dias quem é estropiado de fato: aquela ladainha de calçadas podres, falta de acesso, falta de prioridade, falta de cuidado e atenção dos outros e por aí vai.

pequebrado 

O que é necessário ter consciência social, porém, é que pessoas ‘malacabadas’ temporariamente passam e devem ter os mesmos direitos básicos que pessoas que estão na labuta de maneira definitiva, levando em consideração suas necessidades, claro. Não dá para achar que quem quebrou a pata terá direito à isenção de impostos, né, não? 🙂

Dessa maneira, o povão com mobilidade reduzida temporária pode parar em vaga demarcada, pode entrar em fila prioritária, pode sentar em local determinado no ônibus, pode usar os banheiros acessíveis. Importante é que a pessoa, à medida do possível, explicite essa necessidade.

“Explicita como assim cê fala, tio?!”

olhoroxo

Quem precisar usar a vaga de estacionamento, que coloque um aviso no carro (embora essa medida não evite uma multa, mas é possível entrar com recurso e ganhar fácil), quem precisar usar um elevador prioritário, caso seja conveniente, que explique que está “lascado”.

Embora hoje em dia já exista alguma reflexão social em torno das pessoas com deficiência física, sensorial ou intelectual, quase nada se pensa em relação a quem está “dando um tempo” no mundo dos quebrados.

São quase inexistentes lojas que disponham de equipamentos de aluguel com alguma qualidade, como cadeira de rodas, muletas, botas ortopédicas, talas entre outros para o público.

cabecaenfaixada22

Também não somos habituados a saber como dar um auxílio de forma eficiente e segura para os “mancuebas” provisórios nem oferecer a eles mais atenção e algum cuidado detalhado.

Pode ser que um pouco de atenção e sensibilidade resolva tudo, mas bom também é entender de maneira clara a condição e a necessidade dos outros, mesmo que elas durem apenas uma semana.

Vale abrir uma porta, oferecer uma cadeira de apoio, perguntar qual a melhor forma de auxílio. Importante é que, diante de uma deficiência temporária, tenhamos sempre um olhar mais atento, uma sensibilidade um pouquinho mais aguçada.

*Imagens do Google Imagens

Comentários

  1. Essa minha vida de atleta de fim-de-semana me rendeu um pé quebrado 2011. Foram 33 dias sem o direito de botar o pé no chão, me equilibrado num par de muletas. Usei aquela bota de astronauta por 64 dias e seria um grande mentiroso se dissesse que foi legal (vide http://r.veloso.silva.blog.uol.com.br/arch2011-07-01_2011-07-31.html#2011_07-04_00_22_02-11296120-0).
    A título de teste da raça humana, uma tarde resolvi subir de mala, cuia e muletas num ônibus, para verificar a atitude da galera dos transportes coletivos. Foram cerca de 20 minutos para ir e outros tantos para voltar, e em nenhum momento uma boa alma me ofereceu assento, até porque parece que a maioria tinha tomado uma dose cavalar de sonífero.
    Nesse período estive com a família algumas vezes no shopping e até no cinema. Como sou meio radicalzão não aceitei a sugestão da Eliana de estacionar na vaga especial, deixando um bilhete, mas essas saídas foram úteis para observar o quanto a rede Cinemark está c@g@%#ndo e andando para quem tem dificuldades de locomoção. O local destinado para as cadeiras de rodas já tinha me chamado a atenção, por constituir verdadeira fábrica de torcicolo. Já as escadas e a distância entre poltronas são um acinte à parte.

  2. Jairo, gostei de seu texto. E me lembrei de um prof. da PUC-SP que estava com gota (que doía muuuuuiiitoooo) nas pernas e que andava com muletas por um tempo. Quando eu estava conversando com a secretária de pós do Departamento de psicologia social, ele apareceu e disse que achava que o que reivindicávamos, e ainda fazemos,era exagero, mas desde que começou a andar de muletas, mudou de ideia falando que, dali para a frente apoiava todas as nossas reivincações. Nada como sofrer na pele as dificuldades que nós sofremos, pelo menos os de acessibilidade física. Bjs

    1. Su, vc disse tudo “nada como viver na pele”, mas que seria ótimo isso não ser necessário, haaaah, como seria! Beijoss

  3. Jairo,
    Aqui estou novamente…Parabéns pelo enfoque dado ao “Deficiências Temporárias”. Nesse sentido, sempre temos um potencial de deficiência e há alguns tipos que não são considerados deficientes, mas tem limitações, como as grávidas (nos últimos meses) e alguns idosos…porém há o outro lado, o das pessoas QUE QUEREM SER DEFICIENTES, para levar vantagem. Já vi grávidas de 3 ou 4 meses, que querem regalias desnecessárias e “idosos” que ocupam vagas especiais e são atletas….tenho mais de 60 e coração “malacabado” como você diz (Tive um BAVT) mas não preciso de vagas especiais ou privilégios. Quando realmente preciso de algum tratamento específico é que vou procurar. Em geral não tenho dificuldade, embora algumas pessoas estranhem quando acontece, pois não sabem das minhas necessidades, que não são visíveis. Conheço vários exemplos assim e vale apena abordar o tema também (o das pessoa que tem necessidades não visíveis). É uma situação difícil, há cardíacos que embora com aparência normal, tem muita dificuldade para caminhar, por exemplo e já vi pessoas assim serem hostilizadas por estarem caminhando muito lentamente e atrapalhando…
    Vai aí a sugestão…
    Abraços

    1. José, excelente! Em breve, vou me dedicar a sua sugestão. Muitas das questões que envolvem pessoas com deficiência poderiam ser resolvidas com um instrumento: o bom senso, igual a esse que você tem! De qualquer forma, mesmo vc não usando as vagas, saiba que é seu direito, precisando ou não delas! Grande abraço

    2. Caro José Alex,

      muita gente não sabe, mas durante a gravidez, particularmente nos primeiros meses, as mulheres sentem enjoos e mal estar muito fortes. Outras têm a orientação para não fazer esforço ou carregar peso (o que inclui se equilibrar num ônibus em movimento, por exemplo) nos primeiros meses de gravidez, quando há um risco de aborto espontâneo. Concordo com o princípio do bom-senso, bem como o da educação. Certa vez, uma grávida furou a fila na minha frente e, como não havia notado a sua barriga, reclamei. Ela muito rispidamente falou que estava grávida e eu, constrangida, lhe dei o lugar. Eu certamente teria igualmente cedido o lugar na fila se ela tivesse se apresentado como gestante antes de “furar” a fila.

      Abraços

      1. Laura,
        Por isso escrevi “desnecessárias” A situação que você descreveu é um exemplo das “invisíveis”…Abraços

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