O tempo de cada um
Fiquei quinze anos da minha vida batalhando, junto com minha família, contra o que o vírus da paralisia infantil aprontou com meu corpinho. A ideia era ver se rolaria ficar em pé novamente, dar uns passinhos e uma rebolada…
Particularmente, por mim, essa guerra teria acabado bem antes uma vez que, para mim, a minha vitória já tinha sido consolidada: eu não tinha morrido, eu não me sentia um ser inferior e queria fazer outras coisas da vida além de ficar pulando de hospital em hospital, em cada um deles com uma sofridinha a mais.
Recebo, vez ou outra, críticas por supostamente não entender o “tempo dos outros” para o enfrentamento de suas labutas contra as desgraceiras da existência, sejam elas acidentes graves, doenças, fatalidades.
Segundo algumas avaliações, eu deveria ficar calado diante às ilusões alheias de achar que o bem vence o mal e espanta o temporal, como diriam no He-Man Deveria respeitar o luto de quem chora suas perdas de movimento, de sentido e dar mais esperança e fazer menos crítica.
Tenho um espaço de opinião e de construção de debates. Não tenho uma doutrina de vida para oferecer, não tenho a chave que abre todas as portas dos mistérios da existência nem pretendo inaugurar um templo religioso.
Até hoje, no Brasil, por questões culturais, religiosas e de tradição, seguimos uma lógica perversa que só prega, em um primeiro momento, o valor de: “se esforça que tudo irá ficar melhor, se esforça que Deus proverá”.
Caso eu fosse um adesista a isso, não seria preciso um espaço (e de vários outros) para mostrar caminhos de seguir adiante. Era necessário apenas apostar no potencial dos indivíduos e no divino.
Sou um defensor incansável de “andar com fé”, mas não posso ser omisso, como comunicador, de alertar que outros aspectos são necessários de serem avaliados, mesmo diante do luto da perda de movimentos, de choques profundos na composição do corpo e dos sentidos.
Vendedores de ilusão estão no mundo aos montes. Eles se nutrem das fragilidades e ofertam aquilo que só se realiza nos sonhos. Em dado momento, sobram apenas o deficiente e sua deficiência, além de alguns membros da família.
Enquanto isso, amplia-se o espaço da depressão, da contestação de si mesmo, do fracasso, da repetição e da degradação de tudo de bom e potencial que restou.
A troco do eterno “se esforçar e acreditar” (e só isso mesmo) mais distante se fica da obtenção de instrumentos ímpares para remodelar a vida, tomar um novo rumo.
Cada pessoa tem o seu tempo de descobertas e de olhares diante suas condições paralíticas, tetraplégicas, cegas, surdas. Mas alguém tem de se atrever a chamar a atenção para o tempo que corre, para a vida preciosa que existe e se esgota à luz das promessas e da dó, somente a dó, alheia.
Qualquer condição humana alterada por fatores diversos pode ser realinhada. Cadeirantes podem voltar a andar, amputados podem ganhar uma prótese, cegos podem voltar a ver…
Mas tudo isso precisa ser buscado com a razão e com o preparo necessário para a atuação da ciência, da tecnologia e até do charlatão. E isso envolve seriedade na maneira de entender a si mesmo, envolve abrir bem a mente para que entrem mais informações e possibilidade e menos quimeras e “tosquidão”.
Que reflexão 1000….amei um abraço !
Obrigado! Outro abraço
Eh, meu amigo Jairo, eh, meu amigo Jairo Brown, Jairo Brown. Sempre anos-luz acima da média mundial. Sou fã da sua escrita e da sua cabeça, faz tempo! Abraço, velho!
Ahhh, meu querido… a admiração é recíproca.. e faz tempo! Abrasss
Jairo querido é sempre bom te ler. Sim, o luto pessoal diante de alguma perda é coisa de cada um. Mas um jornalista esclarecido tem que abrir o debate e ir muito além disso. É o que você faz sempre e por isso te acompanhamos como leitores e também amigos. Quando vi que meus nódulos da tiróide podiam ser cancer, quando um cisto no ovário tinha cara de mau não tive tempo de luto, fui logo perguntado aos doutores quando podeiam me operar. Quando perdi a audição com ajuda do meu otorrino querido não tive tempo para luto, corri para conseguir aparelhos auditivos. Claro que não acho que todo mundo tem que ser como eu mas temos sim que abrir o leque e mostrar que há possibilidades além da prostração e do luto eterno.
Sô, cem anos serão poucos para agradecer toda sua gentileza comigo! 😉
Ae Jairão, se liga no ‘quebrado’ sentando o aço no bandido:
http://forgifs.com/gallery/d/216806-1/Wheelchair-hero-vs-robber.gif
🙂
Ca Ra Ca!!!!!
Jairão, como sempre brilhante! Faz tempo que não comento, mas continuo lendo “você”. Ótimo (como sempre), atual, perspicaz, sério e engraçado ao mesmo tempo. Acho isso lindo demais. Sou uma jairete! kkkkkkkk
Com pompom e tudo?!?! ahahhahahah.. beijos, darling
Uma perda, qualquer perda, é um luto. A cada um a cabe viver a sua parte na dor e chega um momento em que ela deve ser esgotada. Temos que levantar a cabeça a qualquer custo e tocar a vida em frente.
Receita? Não tenho.Os que têm fé, buscam a força em Deus. O amor, a atenção, os cuidados dos que nos amam nos encorajam. Penso que não sei teorizar sobre situações extremas.
Saaaaabe… vc é sempre ótima, vó!
olá Jairo, sempre que você, eu ou qualquer outro, deficiente, ou não, falar da preguiça, ou da falta de determinação de alguém que tenha se quebrado, independente de quanto tempo faça, Sempre haverá alguém para nos censurar.
Gosto de cutucar as pessoas sempre que acho que elas estão perdendo tempo. Óbvio que não acerto todas as vezes, mas dei o empurrão necessário em alguns e tomei coice de outros. Entretanto, acho que isto tudo faz parte de nosso aprendizado, e a maioria de nós, também não sabe qual é o tempo necessário para assimilar a cacetada e continuar em frente.
Estou cego a 29 anos, e todas as vezes que ouço a palavra “coitado”, me pergunto,se não é a própria pessoa um “coitado”.
Vamos em frente, “QUEM SABE FAZ A HORA, NÃO ESPERA ACONTECER”.
Abraço!
Dorcival, belíssimo comentário… grande abraço
Isso mesmo, Jairo. Você disse bem. Outro dia, numa matéria, disseram: “A Laís pode inspirar outros deficientes.” E eu digo: “A Laís também pode SE inspirar em outros deficientes.” Para isso, ela precisa ter essa oportunidade. abraços.
😉
Quem é que tá te enchendo o saco agora, Jairão? Fala quem é que eu vou lá encher caboclo sem noção de bofetada e pescotapa..
😀
De qualquer forma, ótimo texto, as always.
E não, não tem como descobrir quem sou eu pq infelizmente não nos conhecemos pessoalmente – ainda.
😉
kkkkk tá certo, então… Abraço
a gente vive, envelhece, gira e roda e acaba sempre voltando e constatando a sabedoria daquele ditado: que eu tenha garra pra mudar o que pode ser mudado, coragem para aceitar o que nao pode ser mudado e sabedoria para ver a diferen’ca.
Beijo, sempre um prazer te ler. Saudades
O prazer é ter vc aqui, tia!!! 😉
O tempo do luto e da negação são tão subjetivos. Depende tanto da criação de cada um, do acesso à informação, de questões religiosas, do grupo familiar e de amigos, enfim, complexo demais.
Sei que para eu passar essa minha fase com a Sofia, de buscar curas fantasiosas e milagrosas, esse blog foi fundamental. Mas também fiz terapia e contei com um neurologista super pé no chão que me alertava contra tantas pessoas mal intencionadas que vendem ilusões a preço de ouro, Somando boas orientações, fiquei mais consciente e consigo até responder melhor aos que acham que ajudam quando dizem que “tem fé que ela vai andar”.
Eu digo que tenho fé na vida. Numa vida que pode ser linda, na cadeira de rodas ou fora dela. Que independe de curas milagrosas. Também tenho fé em Deus e ele me atende, me fortalecendo nas batalhas do dia-a-dia.
Adorei o texto. Como sempre, chega num momento bastante propício!
Beijo
Esse comentário é que foi lindo…
Denise, concordo com você em gênero, numero e grau. Tudo o que você conta da via sacra, eu também passei junto com meus pais. Adorei seu depoimento e o texto do Jairo também. Bjs.
Ótimo texto, Jairo! Principalmente para uma segunda feira em que a preguiça persiste em bater na porta. Abs e sucesso!
Abraço, Patrick
Achei muito interessante a leitura e o que ela nós ensina, parar e pensar muito nos dias de hoje é muito gratificante que nesse mundo que estamos vivendo na tal era da intrnet e maquina , mas maquinas estamos nos tornado umas pessoas muito frias e sem capacidade de nos comunicar atraves de uma simples correspondencia e sem sentimentos. Só Deus pra dentar nos entender . O tempo voa quando vc perebe ja foi, sua juventude, sua esperança e não tem jeti de volta.
Olá Jairo.
A Biblia nos diz que somos exatamente como nos vemos em nossa alma.
Toda deficiencia nasce primeiro dentro e depois se manifesta fora. Sei que há um tempo para cada um absorver e adminsitrar suas proprias dores. No entanto, quanto a mim, uso minha vida, tentando minimizar estas dores nos outros, nao prometendo curas, mas força para lutar, pra viver, porque afinal, como se diz ” a vida é muito pra ser insignificante”.
Bem bonito isso, Sergio… abrass
Esse ano completo 15 anos de lesão. Uma doença sei lá de quê me pegou de repente e fiquei paraplégica. Quando sai do hospital depois de 4 meses internada, a única coisa que pensava era voltar em cuidar do meu filho na época com 4 anos. Mas eu “tinha” que dar um jeito de andar de novo e corre daqui e corre dali pra tentar um “curandeiro” que desse jeito na tal medula que foi danificada. Acredite, eu tentei !! Fiquei achando que eu era uma fracassada por não ter conseguido, pois era tantos votos de Ah voce consegue !! Como encarar que eu não consegui ? Será que eu era acomodada, conformada ou apenas realista ? Vi que eu fui realista, nenhum milagre ia acontecer comigo(acho que minha cota de milagre foi Deus ter me deixado viva) O tempo passa rápido demais, e como vc disse no texto a vida é preciosa.
Caramba, Inês…. me tirou o prumo, agora… emocionante demais..
Oi Jairo!é complicado esse negocio de tempo mesmo,cada um teu o seu diante de sua deficiência.Eu admiro muito essas pessoas que se tornaram deficientes e conseguiram dar a volta por cima em pouco tempo…Uns aceito a sua nova condição física outras não.Eu por exemplo levei 4 anos!!Imagina o quanto eu deixei de fazer nesse tempo?Mas não adianta um e outro falar,essa força de enfrentar a vida está dentro de nós,e senão tivermos uma familia que te apoia,vai ser bem complicado.Só o tempo ,para nos dizer…bjss
Beijos, querida!
Acredito que mais do que no corpo físico a deficiência está na alma, na mente e a cura também está nela. Devemos fazer a cura da alma e prover meios através de pessoas que estão ao nosso lado o tempo todo para que os dias sejam mais amenos e as barreiras vencidas!
Um beijo
Uaaaau!!!
Oi Jairo para mim deveria haver o incentivo de psicologos pessoas que nasceram ou se tornaram deficientes eu depois de algum tempo em análise queria ser feliz e não “normal” e tb as pessoas da família precisam de tratamento hj sofro com essa presão de ter de querer melhorar q me magoa muito
Cláudia, muito corajoso, como sempre, seu depoimento!