Somos muito pobres

Jairo Marques

Amanhã (21/09) vai rolar mais um “Dia Nacional” de luta do povo quebrado e a notícia que tenho para hoje motiva que as pessoas com deficiência continuem em posição de “golpe” e com seus bermudões para entrar no ringue porque a coisa tá feia… 😮

Recebi dois dados que revelam o que parece óbvio, que os “malacabados” e suas famílias, em geral, são muito pobres, mas confesso que me assustei com esses indicadores de vulnerabilidade social.

Os dados foram colhidos entre 506 pessoas atendidas por um projeto social do Instituto Mara Gabrilli. Deixou claro, novamente, que não defendo nenhuma bandeira partidária e que uso os dados apenas para o debate.

Bem, do povão todo pesquisado, 64% se disseram desempregados e 75% afirmaram que a renda por pessoa da família é de 1 salário mínimo, aqueles 678 cruzeiros.

“Mas o que isso quer dizer, Zairo?”

Que dizer que famílias “malacabadas”, nesse levantamento, têm renda, “por cabeça”, menor do que a média do país (R$ 758) e o nível de desemprego também é maior que a média nacional.

Caiu da cadeira? Ficou de boca aberta? Tem maaaais… do universo pesquisado, que é bem representativo, 52% não sabem ler nem escrever, 72% se deslocam apenas com transporte público e 80% disseram que precisam de algum tratamento médico.

Quer mais uma sapatada? Os pesquisados informaram que demoraram, em média, um ano e um mês para conseguirem uma cadeira de rodas do SUS… chorou?! Eu chorei.. 🙄

É preciso deixar claro que as pessoas que procuram os projetos do instituto já são vulneráveis socialmente. Mas jogar uma lupa nas condições dessas pessoas, pelo menos para mim, é assustador.

Com nível de renda baixo, sem emprego, é muito complicado falar em inclusão, falar em viver em sociedade, falar respeito aos direitos da diversidade.

Outro ponto assustador: o CAT (Centro de Apoio ao Trabalhador), órgão aqui da prefeitura de São Paulo, divulgou ontem que tem 571 vagas abertas para os “zimininos” que anda montado em cadeira, que não vê um palmo na frente do nariz (ou quase isso), que tem o escutador de novela avariado entre outras “benesses” de viver… 😎

Pergunta pro tio qual a os salários oferecidos, vai!

“Tio, falaí quanto os malacabados podem desfrutar de salário!”

Em sua maioria, as vagas são para ganhar em torno de 700 “mirreis” e em cargos de nível elementar. Dos 506 empregos, um…. vou repetir, um, oferece salário de R$ 2.500. 😥

Então, o ciclo vai se fechando. Famílias de pessoas com deficiência são pobres, com pouco acesso a tudo e vagas abertas para os “quebrados”, para cumprir a lei, também são quase miseráveis…. Tô exagerando? 😡

Sou um cara otimista, vim de um universo pobre, ferrado e consegui me virar nos 30 para ter uma vida mais digna. Mas o buraco da exclusão geral da pessoa com deficiência ainda é profundo, é dramático.

Então, como eu disse no ano passado, o Dia de Luta tem de ser todos os dias, em todos os setores e de maneira sistemática.

Progredimos mil em vários aspectos e setores, mas tem uma galera que habita essa “Matrix”, esse mundo paralelo que nos enfiaram, longe, muito longe, de conseguir botar a cara em um mundo relativamente melhor.

Comentários

  1. É verdade Jairo, meu amigo!
    Quando colocamos uma lupa, vemos que o buraco é muito mais profundo.
    Na Talento Incluir recebemos muitas histórias de gente com deficiência que quer trabalhar, mas a realidade social impossibilita a saída da pessoa de casa. É MUITO triste!
    Meu entendimento sobre os cargos bases é que é por aí que as pessoas sem formação e sem experiência devem começar. E desenvolvemos as empresas que atendemos para apostar e abrir caminhos para o crescimento desta pessoa que inicia com “dignidade” abaixo da média do brasileiro.
    Abrir qualquer oportunidade para profissionais com deficiência é outra consciência que implantamos nas empresas, porém, o maior problema é que quando as vagas pagam mais, exigem mais capacitação do profissional com deficiência e aí, se o camarada não entregar, não vai dar certo, e isso é coerente.
    Outro ponto é que Lei de Cotas, não é pra quem está pronto! É para que tem na vida o buraco mais dramático. E assim entendo a realidade um tanto injusta destas ofertas de emprego.
    Enfim! Vamos continuar abrindo caminhos… e a INCLUSÃO é possível!

  2. Não temos inclusão e sim integração Jairo, quem pode e consegue se insere nas escolas e no mercado de trabalho, os outros precisam esperar que as empresas e escolas de adaptem a eles.

    Infelizmente esses dados não me surpreenderam, porque viajando por outros estados, vi situações muitíssimo piores.

    Conheci na Bahia, um rapaz que se deslocava dentro de casa com uma cadeira normal de madeira, se contorcendo de um lado pro outro. Não podia usar a cadeira de rodas que estava muito velhinha senão numa emergência estaria ferrado.

    Até os 15 anos não saia de casa porque não andava e como tem os braços muito curtos não pode usar a cadeira de rodas sem ajuda de terceiros. Não sabia ler ou escrever, coisa que conseguiu em casa com a ajuda de uma amiga.

    Apesar de receber o LOAS, não podia estudar porque o dinheiro era usado pra ajudar em casa e comprar remédios pra ele e a mãe adotiva doente.

    Descobri que o maior sonho dele era estudar, então consegui uma cadeira de rodas motorizada e ele fez o supletivo. Prometi que se fizesse o vestibular e passasse, pagaria a faculdade pra ele.

    Hoje, ele é formado em pedagogia, foi o melhor aluno da turma. Trabalha como professor no ensino fundamental e dá aulas de reforço pra crianças e jovens carentes.

    Acho que tudo que essas pessoas precisam é de um pouco de carinho e incentivo pra que possam melhorar suas condições de vida.

    Ainda precisamos de muita ajuda pra se poder comemorar alguma coisa.
    Tem um outro problema que acho gravíssimo, muitos pais acham que essas pessoas não precisam estudar e simplesmente não levam pras escolas.

      1. Obrigada Jairo, mas eu só faço pelos outros o que fizeram por mim. Sempre me deram muita força e ajuda, principalmente nas escolas.

        Se vejo que a pessoa vai levar a sério e tentar melhorar de vida, ajudo com prazer. Só peço uma coisa em troca, quando melhorarem e puderem, ajudem outros que também estejam precisando.

        Aos pouquinhos, uma pessoa de cada vez, a gente consegue melhorar pelo menos a vida de uma família.

        Beijinhos.

  3. Olá Jairo, acho difícil entender em que país nós vivemos de verdade, será que neste que a pesquisas indicam que a maioria das pessoas com deficiência vivem quase a margem da sociedade ou no país onde a presidente anuncia investimentos de mais de mais de 7 bilhões de reais para programas voltados a pessoas com deficiência?
    Será que alguém vai ver uma fração desse dinheiro investido de verdade?
    Sei que o foco aqui não é política mas não pude deixar de comentar.
    Abraço.
    Marco Amaral

  4. Esses números não me assustaram em nada, me deixa indignada, mas já esperava. Só um comentário….a coisa é feia, muito feia!

  5. Oi Jairo! Eu já sabia de tudo isto e a coisa era pior, muito pior na década de 1980, quando comecei a militar. Quanto aos autistas, a coisa tá pegando, mas também tá pegando, e muito, pro lado dos pcs graves e nem tão graves assim. Já ouvi pais dizerem que seus filhos pcs são deixados de lado nas escolas que frequentam, um deles frequenta uma escola paga e bem cara. Esse moleque tinha desejos de morrer, pois não se via como gente! Tem mais, uma pessoa que trabalhava em RH disse que a firma onde ela trabalhava só pegava cadeirantes lesados medulares e sequelados de pólio porque era mais próximo da imagem de uma pessoa sem deficiência e o pc está meio longe disso, né? Se for grave, pior ainda! Quanto ao dia nacional da pessoa deficiente, ela foi criada, não para comemorar, mas para protestar a falta de direitos ou o não cumprimento delas para os estrupiados em geral. Ele foi criado na década de 1980 pelos militantes da época. Bjs

  6. É como uma grande amiga minha costuma a dizer: tudo relacionado à inclusão social das pessoas com deficiência é um mar de rosas. Tudo é lindinho… Oh, quantos exemplos de superação pra nos espelharmos, quantos guerreiros pra nos inspirarmos.
    Enquanto isso, vivemos à revelia. Os ditos exemplos de superação, que tantas pessoas aplaudem e vão às lágrimas ao testemunharem suas biografias, passam necessidades, são obrigados a se adaptarem a um ambiente urbano sem acessibilidade, penam pra arrumar um emprego com baixos salários humilhantes mesmo sob uma lei de cotas.
    O ideal é a pessoa com deficiência deixar de ser obcecada por subir no palanque pra mostrar o que ela não é! A retórica vazia já não nos cabe mais.
    É necessário que trabalhemos duro, que trabalhemos sério e com os pés no chão. Caso contrário, seremos eternamente o país dos exemplos de superação que vão sempre se fuder pra pegar um ônibus com degraus altos, a caminho do seu emprego com salário de merda que ele teve que se humilhar pra conseguir.
    Peço mil desculpas pelo desabafo, mas é isso que eu penso.

  7. Jairo, eu descobri essa realidade na pele: como o acidente que deixou meu marido tetraplégico foi no interior do Pará, eu pude descobrir o quão ruim e precário é o atendimento às pessoas com deficiência, lá mesmo. E olha, é tanta história que dava pra escrever um post contando. Tanta desinformação! Eu adoraria criar um projeto voltado para educação e inclusão de pessoas com deficiência, sabe? Pra ensinar essas pessoas a pescar e a assar o peixe. Quem sabe um dia?
    beijão!

  8. Vi seu texto no blog “Tudo bem ser diferente” e passei aqui para lhe dizer: obrigada por nos trazer de volta para o mundo real. Enquanto travamos nossas lutas virtuais, esquecemos desse universo de pessoas que nem ler podem. Abraços.

    1. Telma, sabe que pensei muito nesse aspecto? De pessoas que estão looonge das ideias que criamos na rede… e elas são, infelizmente, maioria… bjos

  9. discurseiros e festeiros oficiais, enfiem os discursos no bolso, deixem de lado homenagens e outros atos festivos e vambora trabalhar…é isso que o povo em geral merece e muito mais ainda os malacabados pobres, sem trabalho, sem formação profissional, os sem tudo…

  10. quem foi pobre como eu fui – mas lutou e conseguiu vencer – sabe que a politica atual de dar pão e circo ou dar o peixe e não ensinar a pescar é pura demagogia eleitoreira – chega – basta de politicagem

  11. Concordo com muitas partes do texto, mas a luta diária também tem que existir dentro da pessoa com deficiência! Também venho de um familia pobre e trabalho e ralo muito pra ter uma vida digna, mas vejo muito comodismo dos deficientes, que não lutam pra estudar, se especializar, etc. Canso de fazer relatórios pra que eles tentem apenas aquelas bolsas de auxilio doença… Ai, realmente, não da pra ficar reclamando depois!
    Quem põe a cara na rua, trabalha, estuda, cresce profissionalmente , mesmo que com dificuldades, chega lá! E que q luta continue sempre!!!!

  12. Fugindo do senso comum… Muito bacana utilizar dados e indicadores sociais para evidenciar a realidade vivenciada pela grande maioria da população. E, principalmente para que a sociedade conheça e identifique as reais demandas que envolvem as famílias e as Pessoas com Deficiência e agora, também Pessoas com TEA. Talvez já conheça, mas visite também as recentes publicações do PNUD (Relatórios e Atlas). Abçs

  13. Olá Jairo,
    Se já estava ruim para os deficientes, com a entrada dos autistas na categoria dos deficientes, a coisa ficou um horror! E isso se tratando de São Paulo, o estado mais rico de nossa federação. As conquistas que temos por aqui são obtidas a passos de cágados! Com essa lerdeza toda, nossos pimpolhos vão perdendo possibilidades de se tornarem cidadãos de fato. Ficam à margem da sociedade. A tal da inclusão social, que tanto se ouve falar, é mesmo só para inglês ver!
    Ah! O que temos para comemorar esse ano? Bem, preferimos dar o bolo nessa festa, pois não temos transporte para chegar lá e também não temos tido tratamento de saúde, escola e assistência devidas. Com isso, a gente fica pulando o tempo todo, beliscando os convidados, mordendo e dando tapa em todo mundo. Ou seja, vamos ser expulsos assim que chegarmos. Então, é melhor que a gente nem chegue, né? Abração e boa festa!

    1. Marta, amei o seu comentário, que é corajoso e verdadeiro. Agora, na “festa” da diversidade não existe bicão e todo mundo é convidado. Brinco muito com minha mulher que, às vezes, fazemos uma festança por ter conseguido “uma rampa”… Então, a turma do autismo, a mais nova no “bolo”, talvez ainda vá passar por muitos perrengues em busca de seus espaços…. o fundamental é estarmos unidos.. bjoss

      1. Caro Zzaairro,
        Se o que os autistas tiverem que passar for só (!!!) perrengues, tudo bem! Já pensou se aumentarem a discriminação, as portas na cara e os maus tratos nas instituições? Aí, meu amigo, a zente vai voltar para Vênus, que foi onde tudo começou, né? Abração!!!!

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