Acessibilidade zero
Faz alguns dias, em um evento, escutei da boca do governador Geraldo Alckmin uma frase que, afora seu caráter e poder político, deixa um compromisso no ar para ser cobrado insistentemente.
Ele disse, para uma plateia de umas 400 pessoas: “São Paulo é o Estado da inclusão e do respeito às diferenças”.
Não sou apoiador de tucano (estou bem mais para papagaio 🙂 ), mas gostei da manifestação. Acho, inclusive, que por aqui as demandas do povão ‘malacabado’ estão sendo ouvidas, estão sendo encaminhadas e realizadas.
Neste mesmo contexto, recebi um apelo dramático da leitora Luziana Cardoso, 26, que mora no interior da Bahia. Lá, para ser puxador de cachorro, motorista de cadeira de rodas, prejudicado do escutador de novela, “tchube” ou demais sobreviventes da guerra, o cabra tem de ser também muito macho.
“Mucugê, fica no centro da Chapada Diamantina, uma região altamente turística da Bahia. Turistas inclusive com diversos problemas de locomoção. Se isso já seria um empecilho para um possível passeio ou viagem turística, imagina-se que tornasse algo imensamente pior para os seus moradores.
Meus pais são daqui, eu não nasci aqui, mas moro desde os meus 5 anos. Nasci em Feira de Santana, mas nos mudamos pra cá inclusive pelas facilidades que uma cidade do interior teoricamente proporcionaria para alguém com minhas limitações físicas, limitação que não é só minha , mas também de meus irmãos que possuem o mesmo problema ( Distrofia Muscular Progressiva).”
O raciocínio da Luziana está corretíssimo. Espera-se que, no interior as condições sejam menos “brabas” para quem algum tipo de deficiência, uma vez que a dimensão dos problemas é menor e fica bem mais tranquilo de resolver. Sem falar que elementos “complicosos” da cidade grande, como fracasso do transporte público, trânsito caótico, estrutura urbana em frangalhos, quase não existem.
Mas, a realidade não é bem assim. O descaso com as diferenças físicas e sensoriais das pessoas também existe e o imobilismo das condições que não nos favorecem é brutal. A ação política em prol da inclusão em alguns rincões tem força de mosca morta.
“Sou funcionária pública municipal há quase quatro anos, e enfrento problemas diários de locomoção desde que me entendo por cidadã. Entendo todas as limitações de um município pequeno, e que conta com poucos recursos, mas entendo também que atitudes mínimas e iniciativas de média proporção já facilitariam a vida de nós “mal-acabados” como vc sempre diz. Sinalizações, rampas, acessibilidade na amplitude de sua nomenclatura.
Seria mais fácil para mim, e para a sociedade, que eu fosse isolada, mas minha família, e amigos, em especial minha mãe, não nos deixou viver à mercê do mundo. Com grande sacrifício sempre se esforçou para que não vivêssemos somente dentro de casa, atitude essa que me fez ter o não conformismo em viver do jeito que seria mais fácil pra todo mundo.”
Me angustia demais saber que milhares de pessoas com deficiência ainda ficam trancafiadas em casa em decorrência da pobridão urbana, das barreiras arquitetônicas e de atitude. Tenho certeza que, em algum momento da história, a civilização vai se envergonhar muito de tal postura omissa.
Entendo que, em algumas situações, prefeituras pequenas possam ter dificuldades de caixa para ampliar acessos, porém, são vastas as linhas de financiamento e de fomento federais e até internacionais para dar conta do recado.
Outro ponto que envolve apenas responsabilidade e não necessariamente investimento público é o planejamento das cidades. Quando se tem um programa urbano sério, o comércio, os cidadãos tomam medidas que incluem a todos.
“Em todos esses anos em que vivo aqui, algumas adaptações foram feitas na cidade: duas das três escolas da sede do município possuem rampa, mas os banheiros não são adaptados, há rampas de maneiras esparsas e mal localizadas, o que não ajuda muito já que em algumas horas podemos subir num ponto e não conseguimos descer em outro.
O calçamento da cidade é algo dificultoso ao extremo. Por ser um cidade tombada pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), não há possibilidades de grandes mudanças estruturais de acessibilidade, e as mudanças que podem ser realizadas passam por um processo lento e burocrático nesse instituto.”
Fico com sangue nos ‘zóio’ todas as vezes em que vejo relatos que dão conta que o patrimônio histórico está acabando com a história de vida das pessoas. Isso é aberrante, é ultrajante. De nada serve um museu de 500 anos se ele não pode ser contemplado, admirado e desfrutado por todos.
Alguns defensores da “coiserada veia” precisam se atualizar. Precisam de criar maneiras inteligentes para deixar desse ranço de que “nada pode” doa a quem doer. Esse tipo de mentalidade não existe em nenhum ponto civilizado do planeta.
“Devido há esses acontecimentos, resolvi crias uma petição pública, que encaminharei ao Ministério Público, Prefeitura, IPHAN e Câmara Municipal para que algo seja feito pelo menos no intuito de amenizar tais dificuldades.
Sei que o mínimo que eu consiga com minha atitude, não mudará a atitude e o discernimento de cada indivíduo que desrespeita o espaço do outro, que estaciona numa rampa, que ocupa uma calçada, mas mostrando o meu direito de manifestação e indignação sei que outros buscarão também os seus direitos.”
Eu apoio demais a atitude dessa baiana, mesmo aqui, há quilômetros de distância. Atitudes são fundamentais para a mudança de realidade. Bora gritar bem alto para que alguém em Mucugê nos ouça… Mucugê e qualquer outro município dos “confins” brasileiro… com orgulho.
Fala jairão saudades meu amigos é meu caro esse Brasil tem ainda muita coisa a ser feita para os malacabados!!!
Por isso a gente tem de seguir unido!! Abraço
Me perdoa o sumiço tioooo…mas eu nunca esqueço de voce…eu sempre volto rsrs.. Gostei da sua sujestão, acho q chegou a hora de eu parar de brigar com peixe pequeno por aqui…Não é possivel que em pleno abc ainda existam cidades assim como a minha! Tio voce saberia me orientar, indicar como eu encontro a Secretaria da pessoa com deficiencia do estado? pergunta boba mas estou um pouco sem saber por onde começar…bjsss
Querida, há um site oficial da secretaria. Alí há contatos diversos! 😉
Tambem sou mãe de um portador de Distrofia Muscular de Duchenne e Presidente da Sociedade em Prol da Acessibilidade de MS. Moro em Campo Grande e, acredite, nossos problemas e lutas não são tão diferentes das suas. É um mal nacional! Assinei sua petição. Receba minha compreensão e solidariedade.
Eu já morei em Campo Grande!!!!
Oi tiooo…saudadessss…esse post me chamou a atençao. Como eu sempre comentava aki no blog, eu moro em Ribeirão Pires, sofro muito com a falta de acessibilidade aki..as ruas são quase todas de paralelepipedo..eu tenho uma cadeira motorizada mas nao consigo sair nem para ir ao mercado c ela…ela trepida demais..quase nao sai do lugar! As calçadas sao esburacadas..sem rampas…eles adaptam um pedacinho do centrinho da cidade pra ficar bonito pra quem chega de fora mas esquecem do restante..Transitar por aki é uma dificuldade para as pessoas com deficiencia! bjosss
Sumidooooona!!! Acho que vc tinha que relatar o seu caso ao governo do Estado, à Secretaria da Pessoa com Deficiência e cobrar dos órgãos o compromisso do tal “Estado da inclusão”!!!! Bjosss
Aqui em Bento Gonçalves ( serra gaúcha) tb sofremos com o descaso da acessibilidade em detrimento da preservação das casas antigas construídas pelos imigrantes italianos, a maioria com escadas..como se as casas históricas não ficassem em maioria em distritos,nem dentro da cidade temos acessibilidade..mesmo tendo um político “tradicional” com uma filha cega,pouco se avançou nesta área(só temos UM sinal sonoro) e quase nenhuma loja parece ter vontade de por rampas e afins.Pra coroar tudo, a topografia não é nada amigavel.Mas sempre pensei o contrario: que cidades maiores,mais visadas e mais ricas como Rio,SP tivessem mais atenção quanto a isso,ja q a população,turistas e numero de idosos e deficientes tb é maior. Estamos ralados de tudo que é lado e nem temos como fugir ehehe abraço!
Talvez, então, a cegueira não seja tão impactante na filha como é no pai, não acha?! Abrasss
Já assinei a petição, acho isso uma força uma lição realmente, e esses políticos não venham me dizer que é por causa de verbas, pq vcs roubam mesmo, to passando uns dias em uma cidade no interior da Bahia também e aqui rola solto a ladroagem. Parabéns Lu pela sua atitude e o Jairo por ter ajudado, vamos unir forças pra que possamos valer o direito de ir e vim o direito que é simples, não é nem pedi muito!
Aêêê!!!!
Este tipo de descaso se vê pelo Brasil afora. Aqui mesmo no Goiás, temos cidades como Pirenópolis e a Cidade de Goiás, que são tombadas e não se pode mexer em nada. A consequência é que as pedras de calçamento acabam sendo mais importantes que as pessoas. Impossível uma cadeira de rodas transitar por ali, até porque as calçadas praticamente também não existem. Há consequências também para nossos idosos, os carrinhos de bebê e mesmo nós, os lindos ‘normais’, podemos levar um capote. Do alto de minha ignorância, imaginava que históricas eram as edificações, praças e peças expostas nos museus, não reles e malditas pedras que não podem ser cobertas por asfalto porque o IPHAN não permite. A propósito, a petição é aberta. Aproveitei e assinei, e deixo a sugestão que todos o façam. Bom fim de semana a todos e nada de juizo.
Negão, vc é um cabra viajado… sabe que em cidades milenares, como roma, madrid… algumas calçadas tb são preservadas (e olha que o valor histórico, pelo critério exclusivamente do tempo, é infinitamente maior), mas se adapta uma porção delas para, justamente, poderem ser transitadas por todos… abrass
Confesso que fiquei com vergonha ao andar por Roma. Pra ficar só num exemplo, que dá uma idéia do todo: o Coliseu, que deve ser mais velho que o Sarney, recebeu obras que proporcionam acessibilidade total, inclusive elevadores. Então, qual é a dificuldade? Escrevi há algum tempo um artigo, em que enchi de fotos e levantei a questão da preguiça dos gestores públicos brasileiros. Esse papo de que é histórico e, portanto, é ‘imexível’, é balela do IPHAN. Quem anda por Barcelona observa que as ruas calçadas com pedras possuem uma faixa cimentada ou asfaltada, para uso seguro de quem precisa. Em Florença a mesma coisa. O que falta no Brasil é uma boa dose de vergonha na cara e, talvez, uma petição pública visando a alterar a lei que trata do tombamento. Reconheço que não domino a matéria, mas me parece que em muitos casos não se pode fazer nada por conta de uma lei idiota.
Acho que, além da lei, há pessoas idiotas no processo tb… abrasss
Oi Jairo amei o post sou Baiana e vivo em Eunápolis perto de Porto Seguro e a acessibilidade nas duas cidades e bem ruim e olha Porto Seguro cidade histórica e eu estou me tornando historiadora e o acesso pra trabalho da faculdade nos museus da cidade e sem acesso nenhum.Mas gostaria de deixar uma contribuição que não é só problemas em áreas de responsabilidade pública e tb estabelecimentos particulares
Cláudia, essa realidade entristece e envergonha a gente. É preciso bater muito bumbo para que quem manda tome atitudes… bjos