Dez dicas para o início da vida cadeirante

Jairo Marques

Sempre recebo mensagem de um povo que se estropiou há pouco tempo e me pede algumas dicas para que consigam se virar com mais tranquilidade na vida “malacabada”.

Esse é um dos benefícios das “internetes”, né, não?! Aproximar pessoas que precisam de informação daquelas que as detém de alguma maneira.

Ontem, recebi email da Suzana Marques da Fonseca, mulher daquele desembargador cegão famoooooso, com mais dúvidas do que prova de vestibular… 🙂

Ela entrou para o time dos cadeirantes recentemente e tá se lascando um pouco para ajeitar situações básicas da vida sobre rodas. Então, resolvi escrever este post com algumas dicas para quem tá entrando agora para esse universo paralelo de quem tem alguma deficiência!

Certamente, vou me esquecer de algo, então, conto com “ceitudo” para me ajudar nos coments! Fechô?!

1º – DÁ PRA SE ACOSTUMAR COM AS QUATRO RODAS?

Entenda que a cadeira de rodas vai fazer parte de seu corpo. Escolha um modelo levando em conta o seu conforto EM PRIMEIRO LUGAR. Nunca vá na conversa de que o ‘cavalo’ é mais prático pros outros empurrarem, pois é você quem vai puxar o bicho na maior parte do tempo. A cadeira tem de ser leve, ser ajustada às suas medidas e ser de fácil condução para você. A gente não se acostuma, mas adere à vida!

 2º – COMO EU VOU ME VIRAR NA RUA?

Antes de sair para a rua com seu veículo de rodas, é importante ter um bom controle sobre ele. Cadeira de rodas empina com obstáculos, emperra em buracos, não passa em portas estreitas. Tenha uma boa noção das dimensões e possibilidades da sua. No Brasil, não dá para fazer grandes percursos a bordo da cadeira, nesse caso, será preciso ajuda!

3º – EU NÃO VOU TER MAIS INDEPENDÊNCIA?

A cadeira não é algo para escravizar, muito pelo contrário, ela é libertadora. Dá para fazer tudo nela, desde que você se antecipe aos fatos, tenha o cuidado de pesquisar sobre o lugar que você irá. Sim, ainda não vivemos em um país plenamente acessível e para não nos lascarmos é preciso ser prevenido. Aos poucos, você vai reconquistando sua liberdade comprando um carro adaptado, conhecendo linhas de ônibus acessíveis ou indo de metrô, táxi etc. Táxi acessível existe, mas é mais cômodo e prático para pessoas com restrições severas de mobilidade, que usam ‘cadeira elétrica’. O restante dos cadeirantes deve pedir carros grandes. Há vários modelos que cabem tranquilamente o nosso tomóvel. Peça por eles. Se, de qualquer forma, você preferir os carros adaptados, o pessoal do blog “Mão na Roda” fez uma relação dos serviços que existem em todo o país. Para ter acesso a ela, basta clicar no bozo! 

4º – EU VOU SER UM CABRA DOENTE?

 

Como diria minha tia Filinha “difinitivamente”, não. Ser cadeirante, em geral, é uma condição humana, igual a ser japonês, ser índio, ser smurfs… 😉 . As pessoas vão projetar em você um dó, um olhar de doentinho, mas e daí? Claro que pessoas com sensibilidade comprometida, vão ter de, no começo, fazer acompanhamento médico, aprender ter cuidados com o “xixo” e tals, mas e daí? As pessoas com deficiência têm uma condição diferente, mas não precisam de ficar segurando soro, tomando benzetacil.

 5º- E COMO EU COLOCO A CADEIRA NA CHARANGA?

Por mais práticas quer possam parecer, aquelas cadeiras de rodas que fecham em ‘x’ são pesadas. As chamadas ‘monoblocos’ costumam ser melhor para nosso corpinho. Elas soltam as rodas, dobram o encosto das costas e soltam, às vezes, as rodas dianteiras. É possível colocá-las, com jeitinho, EM QUALQUER CARRO. A minha já foi até dentro de um KA, que nem KARRO é, né? KKKKKKKKKKK

 6º – VOU CONSEGUIR VIAJAR SOZINHO EM UMA CADEIRA DE RODAS?

Com tranquilidade. Eu saracoteio em riba da minha desde adolescente. Claro que vão te perguntar: “Você fugiu do hospital das clínicas? Está perdido? Está sozinho?” umas mil vezes, mas e daí? As Cias aéreas vão te ajudar no embarque e desembarque (Sim, às vezes demora, mas é do jogo), vão te auxiliar no que for necessário dentro do aeroporto. Caso precise de algo diferente do básico (te jogar daqui para acolá kkkkkkkk), explique, informe, diga!

 7º – DÁ PARA FREQUENTAR RESTAURANTE, BOTECO, TER VIDA SOCIAL?

A velocidade da mudança da arquitetura das instalações do Brasil aumentou muito nos últimos anos. Já existem muitos botecos, pé-sujos, baladonas com acessibilidade. Caso não haja rampa ou banheiro que caiba a cadeira de rodas, o mundo ideal é o que o cadeirante enfrente a situação. Assim, mais gente mostra a cara e a necessidade desses equipamentos. Não dá para esperar o mundo ser o perfeito para que possamos desfrutar dele.

8º – EU SÓ VOU USAR PIJAMÃO E CAMISOLA?

 

Pelamooor. Claro que se vestir na cadeira de rodas vai exigir alguma prática. Cada pessoas vai criando suas maneiras de melhor botar as “carças”. No início, o melhor é se vestir na cama e, depois, se transferir para a cadeira. Escolher roupas que não apertam e levar em conta que você irá passar o dia toooodo sentado é importante. Poucas lojas tem provadores acessíveis, nesse caso, ou você troca na caruda, escondidinho, ou pede para ir até o banheiro.

9º – TEREI DE TOMAR BANHO NO PANINHO?

 

Nem pensar. Há quem opte por cadeiras de banho e outros por cadeiras de plástico, mesmo, que ficam no box do banheiro. O importante é você se sentir seguro. Barras de apoio ajudam muito nas transferências e para conseguir equilíbrio para passar sabonete nas partes… 🙂

10º – VOU SER UM MONDRONGÃO OU UMA MONDRONGONA QUE VIVE PRECISANDO DOS OUTROS?

Independência é algo que se vai conquistando à medida que você cria suas formas de se virar. Cadeirantes moram sozinhos, exercem funções complexas em sociedade, dirigem, casam, transam e vivem suas vidas de forma plena. Para tudo isso, é preciso que haja disposição a aprender levar sua nova vida. Tudo é possível e isso não é um bla-bla-bla. Ajuda, em algum momento, todo mundo precisa. Não é vergonha pedir. Com o tempo, mais e mais conquistas você vai tendo. A cadeira vai te limitar? De algumas maneiras, sim, mas não vai te impedir de viver, se realizar, ser feliz….

*Imagens retiradas do Google Imagens

Comentários

  1. Legal demais a ideia deste post, Jairão!!! 🙂 Funciona como um guia para “calouros na vida cadeirante”. Afinal, quem se vê nesta situação (principalmente quando a pessoa fica assim subitamente, como em caso de acidente, por exemplo), quer saber como vai ser o dia-a-dia dela daqui para a frente…

    Inspirada na sua ideia, resolvi fazer algo parecido em meu blog “Sopa de Números na Educação Inclusiva” – só que com o enfoque para deficiência visual. Assim sendo, fiz um post com o “Guia para Cegos Iniciantes”! 😀 Dê uma “zoiada” lá:

    http://www.sopadenumerosecalculos.blogspot.com.br/2012/12/perdeu-visao-seu-manual-basico-para.html

    Se gostar, já sabe o que fazer, né? Rerrerré! Comente e divulgue o post para a galera que possui problemas com a potência visual! 😉 Abraços!!!

  2. Oi Jairo!
    Nunca escrevi no seu blog, mas sou sua leitora há um tempo…
    Mas não resisti fazer um comentário sobre a cadeira de plástico, e por isso, estou aqui, só pra dizer que não retire a sugestão do uso da cadeira de plástico! rs… Infelizmente Herbert está enganado, ela é segura e eu só sei tomar banho nela, faço isso a vida toda! rs
    E o fato de deslisar, é mais importante ainda, pois pra mim, esse fator é essencial para que eu possa me deslocar na melhor posição em baixo do chuveiro enquanto tomo banho! rs
    Portanto Herbert, a cadeira de plástico é recomendável sim, basta que esteja de acordo com o gosto de cada um! 😀
    Bjo Jairo! 🙂

    1. Andréa, vc tava escondida, é?! ahahhahahahaha…. Uma outra vantagem é que a cadeira de plástico vc encontra em qualquer lugar. Qdo se viaja, por exemplo, fica mais fácil de encontrar ou se adaptar! Bjoss e comenta mais!!!!

  3. Show de bola, tio. Faço coro com a Carlena sobre os olhares. É necessária boa dose de paciência com a curiosidade alheia e um bocadinho de discernimento quanto à existência ou não de maldade. Às vezes as pessoas não possuem a necessária sabedoria para perceber quando estão sendo inconvenientes, outras ainda não viveram o suficiente para aprender sobre a diversidade. Meu filho tem nove anos, desde sempre foi educado de forma a olhar as diferenças como características inerentes a cada um e acabou pisando na bola ao me perguntar qual era a nacionalidade da Lak, naquela noite memorável do seu aniversário. Eu já tinha falado sobre ela para ele, deve ter esquecido. A Lak achou graça, eu não, mas cito este exemplo para mostrar que haverá situações em que perguntas serão feitas, olhares prescrutadores perturbarão, vagas exclusivas serão desrespeitadas, mas não pense, Suzana, que só encontrará coisas negativas. Pelo contrário, o Augusto lembrou bem o que é bem viver (tô chegando, Gutão!), o mundo continua aí querendo ser descoberto e explorado, e imagino que a palavra-chave é otimismo. Beijão a todos, e até a passeata.

    1. Ahhhh, se eu tivesse visto a cena da “nacionalidade” eu teria rolado de rir!!!! Tudo que é ingênuo não é desrespeitoso!!! Isso dá até um post, heim?! abrassss

  4. Unquestionably believe that which you said. Your favorite justification seemed to be on the internet the easiest thing to be aware of. I say to you, I definitely get annoyed while people consider worries that they just don’t know about. You managed to hit the nail upon the top and defined out the whole thing without having side effect , people can take a signal. Will likely be back to get more. Thanks

  5. Olá Jairo!! amei a forma que vc abordou essa condição de “INdependência”!! sou mãe de cadeirante e amiga da Suzana já tem muito tempo! Meu filho é o Rafael Bonfim, que tb tem um blog na Gazeta do Povo de Curitiba, Inclusilhado… não sei se vc já o conhece… ele tb fala sobre limites, sitauções cotidianas, liberdade e sobre todas as andanças dele nesse mundão!! E tb pensa como vc, e eu tb! a cadeira É a liberdade, é a facilidade (dificuldade tb), mas jamais limite. Pessoas usam óculos, outras são baixas, outras usam cadeiras… somos esse emaranhado de tipos diferentes! Paciência para aprender é importante, sim! Jeitinho sempre, com bom humor fica melhor ainda!! Parabéns pela sua página! Virei aqui outras vzs e vou mandar seu link pro Rafa!! Vcs poderão conversar muito!! Ele faz parte dos “Super Normais”… não sei se vc já leu sobre eles, ou viu as tirinhas que saem toda semana no Face!! Ele e uma amiga cadeirante tb e um cego são os Suoer Normais – levam a vida como qq pessoa e dão recados excelentes através da tirinhas!! dá uma olhada lá no Face que vc vai gostar!! grande abraço, Lucília Bonfim

    1. Lucília, coisa querida, conheço o Rafa, sim! Inclusive ele já foi personagem aqui no blog! Tamujunto… beijocas e volte mesmo!!!

  6. Oi Jairo, hoje ajudei um rapaz cego no metro.
    Vi ele descer, ficou sem saber qual lado ia. Cheguei e falei, a sáida tá na direita, tem escada rolante. Ele estendeu a mão, segurei e guiei, a escada tava parada, avisei, subimos. Disse que iria para Corinthians Itaquera, guiei até a próxima escada rolante.Eu tinha que ir pro outro lado, avisei. Me agradeceu e seguiu adiante. Deixou meu coração alegre pelo resto do dia. Só uma ajudinha, sem peninha. E assim que faz, fessor?

    1. Exatamente isso…. e seguindo as orientações dele… fantastico… isso é o que eu chamo de mudar o mundo!!! Beijão

  7. Boa Jairão, sabe que apesar de ter pólio desde os 4 meses, agora é que estou me adaptando a nova vida na cadeira, pois sempre fiz uso das oŕteses e muletas canadenses, porém a síndrome pós pólio me fez optar pela cadeira em virtude das dores e cansaço na locomoção. No começo me senti muito perdida, pois me achei muito mais limitada, mas tudo é questão de adaptação mesmo, a gente vai encontrando o nosso “novo jeito de ser” . É só encarar e seguir em frente, sem medo de ser feliz!!! Adorei o post!!! Beijos

    1. Querida Marcia, há alguns meses contei aqui no blog uma história de uma pessoa com uma história super parecida com a situação que vc narra. Tem que fazer uma busca no blog antigo… se não conseguir, eu te ajudo a achar, tá bem?! Bjosss

  8. Eu sei que é bizarro, mas eu sempre vejo cadeirantes com mais independencia do que eu que quase não enxergo ( é difícil explicar isso, uma situação que não é 8 nem 80), as vezes da vontade de trocar..ser cadeirante mas ver bem direito eheh lendo este post lembro que quando era pequeno não sabiamos que existiam serviços de orientação aos esgualepados dos “ótcho”.. por azar esse serviço, hj, nao tem na minha cidade..me disseram q em aeroporto é supertranquilo e eu to pensando em viajar sozinho ( ou quase, se tiver ajuda), um projeto pro ano que vem, um dia tenho de começar né? eheh Abraço!

  9. Olá Jairo tudo bem? saudades brother. Legal o Post, só queria deixar consignado que o tempo é o melhor remédio e que quando menos se espera estamos não só adaptado na nova vida de cadeira como começamos a fazer extrapolias como andar de handbike, saltar de paraquedas, nadar, canoagem, vela, vôo livre e por ai vai… Boa sorte à todos nessa empreita maravilhosa que é a vida, quer seja de cadeira ou não! Abraços e Bons Vôos!

  10. Pra conseguir guardar minha cadeira no carro sozinha contei com a ajuda do meu fisioterapeuta. Treinamos incansavelmente durante alguns meses até que eu pegasse o jeito e os macetes pra montar e desmontar a cadeira e poder sair de carro sem depender sempre de um acompanhante. Fica aí a dica… Quem tiver acesso a um fisio que tenha um “pouquinho” de paciência pra ajudar no treinamento garanto que o resultado pode ser muito bom.

  11. Adorei e morri de rir junto com o Ricardo!!! Você é ótimo!!! Minhas dúvidas eram quase nada perto de tudo que você expôs e nada melhor do que um “quase nada” esclarecido.
    Também gostei dos comentários. Que bacana, aqui temos uma situação “ideal” de comunicação. Valeu muito Jairo! Beijos, Su

  12. Acostumada a usar aparelhos e muletas, comecei a usar cadeira de rodas há cerca de 7 anos. Ainda bem que é somente em algumas situações. Não consigo colocar ou tirar sozinha a cadeira do carro. Para mim ainda é complicado depender de alguém para sair do carro. Ficar só na cadeira somente onde tenho certeza de encontrar acessibilidade plena o que é raríssimo. Sempre levo junto minhas muletas pois fazer xixi é inevitável e banheiro bem adaptado é outra coisa rara no nosso pais.

    1. Betinha, colocar a cadeira dentro do carro sozinho exige muita disposição, um pouco de paciência. É possível, desde que exista um pouquinho de força! Bjosss

  13. Prezado Jairo
    Em primeiro lugar : adoro ler sua coluna – acho que você é insuperável e seu bom humor é que ajuda em muito quem precisa do “tomóvel”.
    Quanto à sugestão do banho: se puder, retire a tal “cadeira de plástico” – elas são muito perigosas porque escorregam no sabão que fica no piso e….kabum !!!! tá lá um corpo estendido no chão e feito o estrago.
    No mais….parabéns pelas suas dicas.
    abraços,
    herbert.

    1. Oi, Herbert, eu uso a cadeira de plástico há vinte anos ahahhahah… mas vc tem razão, não é a maneira mais segura, sobretudo para os “novatos”… um abraço

  14. Completando a ideia do tio: Prepare-se para os olhares! Sim… mtos olhares! Olhares de espanto, de piedade, de curiosidade… eles fazem parte da nossa rotina. Porém, ACREDITE: vai chegar o dia que os olhares que mto incomodaram ñ te afetarão de forma alguma pq vc vai estar tão de bem consigo mesmo(a) que essa paz interior vai te fazer pensar: eles me acham lindo (a). É sério viu, pode acreditar!! Beijo e boa semana!!

  15. Ao mesmo tempo que busco oferecer os estímulos necessários para que meu filho algum dia aprenda a andar, tenho preparado a minha mente para a possibilidade de ele precisar de cadeira de rodas. Dicas como estas são muito úteis. Obrigado. Abraço, Fábio Ludwig

    1. Fábio, estar preparado para uma situação, a meu ver, é uma forma de drilhar fácil os desafios que ela poderá impor… vc é um pai que me inspira um bocado…. forte abraço

    1. Sergio, obrigado demais pela presença diuturna e o apoio incondicional… isso é demais de motivador pra mim… abraço

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